Conforme apresenta o desembargador Alexandre Victor de Carvalho, em um país marcado por profundas desigualdades sociais, o Poder Judiciário enfrenta, diariamente, decisões que desafiam o equilíbrio entre a aplicação da lei e a busca por justiça social. Foi exatamente nesse cenário que o desembargador se destacou ao atuar em um emblemático processo de furto envolvendo itens infantis. O caso, ocorrido na cidade de Belo Horizonte, chamou atenção por confrontar a letra fria da lei com a realidade dura vivida pelos acusados.
Neste artigo, vamos entender melhor os fundamentos da decisão proferida pelo desembargador, os desdobramentos do julgamento e a importância do seu posicionamento diante do princípio da insignificância.
O caso julgado: o furto e as circunstâncias
O processo analisado pelo desembargador Alexandre Victor de Carvalho envolveu dois réus, acusados de furtar roupas infantis em uma loja da rede Carrefour. Os itens, avaliados em cerca de R$ 111,60, incluíam peças para o filho recém-nascido do casal. A acusação foi baseada em confissões extrajudiciais e imagens de segurança, que confirmavam a subtração dos objetos. No entanto, a sentença de primeira instância condenou os réus a quase dois anos de reclusão, além do pagamento de multa.

Para o desembargador, relator vencido no julgamento, a análise do caso exigia mais do que a mera aplicação do artigo 155 do Código Penal. Em seu voto, o desembargador argumentou que o furto de bens de pequeno valor, especialmente diante da condição social dos réus e da natureza do objeto furtado (roupas para um bebê), não justificava uma pena tão severa. O magistrado defendeu que o Direito Penal não deve ser instrumento de repressão desproporcional, mas sim de justiça e humanidade.
O princípio da insignificância: limites e possibilidades
O desembargador Alexandre Victor de Carvalho fundamentou sua decisão no princípio da insignificância, uma doutrina consolidada na jurisprudência brasileira, que busca afastar a aplicação do Direito Penal em casos de mínima ofensividade. Segundo ele, o valor reduzido dos bens subtraídos e o fato de os réus serem primários deveriam ser suficientes para afastar a tipicidade penal da conduta. Para o magistrado, aplicar pena privativa de liberdade a pais desesperados por roupas para o filho recém-nascido é socialmente injusto.
Além disso, o desembargador relembrou precedentes do Superior Tribunal de Justiça, que já reconheceram a insignificância de valores bem superiores ao discutido no processo, inclusive em casos de descaminho. Citando decisões em que o valor da res furtiva chegou a ultrapassar R$900, o desembargador reforçou que a interpretação da lei penal deve considerar o contexto, o bem jurídico afetado e o impacto social da decisão.
Um voto vencido que ecoa além do tribunal
Mesmo sendo voto vencido, a manifestação do desembargador Alexandre Victor de Carvalho teve repercussão importante. Ao enfatizar que o sistema penal não deve punir com severidade desnecessária crimes de bagatela, o magistrado levantou discussões relevantes sobre o papel do Judiciário em um país desigual. Seu entendimento propôs a substituição da pena de prisão por outras sanções mais adequadas, como penalidades administrativas ou educativas, que evitariam a exposição dos réus ao sistema prisional.
O magistrado ainda alertou para o risco de encarcerar pessoas em situações de vulnerabilidade, alimentando o ciclo de exclusão e criminalização da pobreza. Segundo ele, prender pais que furtam por necessidade não soluciona o problema, apenas o desloca para dentro de uma estrutura carcerária falida, que dificilmente reabilita, mas frequentemente degrada. O voto do desembargador, mesmo isolado, demonstrou coragem e sensibilidade jurídica, apontando caminhos mais humanos para o Direito Penal brasileiro.
Em suma, a atuação do desembargador Alexandre Victor de Carvalho neste caso é um exemplo de como o Judiciário pode – e deve – ir além da aplicação literal da lei, abraçando uma visão constitucional, proporcional e empática da justiça. Casos como esse nos lembram que o Judiciário tem papel essencial na construção de uma sociedade mais justa, especialmente quando seus membros atuam com consciência crítica, sensibilidade humana e profundo compromisso com os princípios constitucionais.
Autor: Luvox Pherys